Olhos grudados na vitrine da loja, uma
pequena menina olhava uma boneca luxuosa, vestida de cetim, cabelos louros e
grandes olhos azuis. Dedinho na boca, a pequena remoía o desejo de pegar aquele
lindo brinquedo e sair mostrando para suas amiguinhas. Elas morreriam de
inveja. - Que boneca rica...! - diria uma. Outra, despeitada, repetiria: - Vou
ganhar uma igualzinha... Estava tão embevecida que tomou um susto quando o
homem da loja disse: - Cai fora malandrinha!
Só então voltou à realidade de sua
vida. Olhou suas roupas rasgadas, pés descalços e sujos, sentiu o estômago gritar de fome, lembrou-se das noites de frio, da solidão, dos
abusos. Sua pequena cabeça não entendia porque ela não era como aquelas meninas
que via passeando pelas ruas, acompanhadas dos pais, sorvete na mão e recebendo
cuidados da mãe.
Afastou-se da vitrine com lágrimas nos
olhos, mas ainda lançou um olhar na direção do rico brinquedo que ficou lá,
olhando para ela como a desafiá-la. Foi juntar-se as outras crianças, como ela,
sem esperanças. Chorou muito, lembrando do brinquedo e de como o homem a
expulsara de lá. Ela não fizera nada, só estava olhando, pensava a coitadinha.
Na sua inocência pediu a Deus que lhe desse uma boneca como aquela, no Natal, e
uma mãe.
Dormiu na sarjeta. No dia seguinte, ela
não lembrava como acontecera, acordou num lugar que sua cabecinha identificou
como um hospital. Uma mulher bonita e sorridente cuidava dela. Olhou em volta
procurando as amiguinhas de infortúnio. Não viu nenhuma. Queria perguntar,
saber como fora parar ali e onde estava a Neguinha que ela
considerava uma irmã mais velha. Sua voz não saía. Olhou para si admirada.
Estava limpa, roupa nova, cama quente. - Cama! - pensou. Desde que se conhecera
como gente dormia pelas calçadas. Não conhecia pai nem mãe, não tinha uma casa.
Agora estava ali, cuidada e sem sentir fome.
Neste momento entra uma moça radiante,
parecia estar envolta em uma luz branca, trazendo nas mãos um pacote.
Aproximou-se dela e, sorrindo, disse:
- É seu. Vamos, abra!
Quando abriu o embrulho, os olhinhos
arregalaram-se.
- Meu Deus, que coisa maravilhosa!
Exclamou. - É pra mim...?
- Sim! - respondeu a moça. – Seu pedido
foi atendido. É a sua boneca... Gostou?
- É linda - disse a menina com os
olhinhos marejados - é a mais bonita que já vi...
A felicidade envolveu a pequenina que
sorrindo abraçou a mulher em sinal de gratidão e, finalmente, perguntou - Onde
estou? Como vim parar neste hospital?
Sorrindo, a moça lhe respondeu:
- Aqui não é um hospital, é o Céu! Esta
- apontou para a mulher sorridente - é sua mãe.
(Maria Hilda de J. Alão)
(Histórias que contava para o meu neto)