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domingo, 13 de março de 2022

A FESTA DA GRAMÁTICA

 




Um dia dona Gramática resolveu dar uma grande festa. Queria reunir todos os membros da Língua Portuguesa. Convite feito, convite aceito. No dia marcado foram chegando os componentes da Fonética, da Morfologia, da Semântica, da Sintaxe e da Estilística e já foram formando seus grupos. Todos vestidos a caráter. Dona Gramática estava feliz com o evento. Como é bom ver os filhos reunidos em concordância.

O baile estava animadíssimo. O Ditongo dançava com a Divisão Silábica muito disputada pelo Tritongo e pelo Hiato. O Radical conversava com a Raiz enquanto observavam o animado jogo de palavras entre o Sinônimo e o Antônimo. A Conjunção, que havia bebido um pouco, não sabia se era coordenativa ou subordinativa, foi preciso a intervenção da Interjeição para acabar com a dúvida. O grupo das Vogais desafiava o das Consoantes.

O Substantivo estava numa dura queda de braço com Adjetivo, tudo num clima de amizade. O Artigo Masculino namorava, lá no cantinho escuro, com o Artigo Feminino que determina a palavra Felicidade para que ela seja eterna. A Derivação batia um papo com a Composição. Falavam das suas formações. A Derivação se acha importante porque é formada por sufixação, prefixação, parassíntese e derivação regressiva. A Composição também tem seu orgulho ora ela é justaposta, ora é aglutinada. A Oração Sem Sujeito fofocava com Oração Reduzida, o Objeto Direto deu uma rasteira no Agente da Passiva e saiu com a Regência Nominal em clima de Prosódia e Ortoépia. A Onomatopeia rodopiava pelo salão. O Eufemismo tentava suavizar as palavras para dizer à Hipérbole o quanto ela dança mal. O Pleonasmo dizia à Antítese que só acreditava naquela festa porque estava vendo com “seus próprios olhos”. A Reticência dava uma de cantora, mas era tão desafinada que o Cacófato veio correndo para calar “a boca dela”.

Lá pelas tantas, a Gramática ouviu um rumor parecido com uma discussão. Correu para o canto de onde vinha o alarido e chegou a tempo de ver e ouvir o Verbo gritando:

- Eu vou falar, eu quero falar.

A Gramática interferiu.

- Meu filho qual é o problema?

Nesse momento já havia parado a música e todos estavam aglomerados em torno da Gramática e do Verbo.

- Desde que eu cheguei nesta festa que ouço vocês contando vantagem. Um é isso, outro é aquilo. Porque um é melhor e o outro pior. Droga! Nós somos uma família. Pertencemos ao mesmo idioma, sendo assim um não pode ser melhor que o outro. Nenhum brilha mais que o outro.

Foi nesse momento que o Verbo Auxiliar aplaudiu:

- Bravo companheiro. É isso aí. Onde já se viu uma coisa dessas. Já pensou se cada elemento de um idioma começasse a dizer que é o tal? Seria uma Babel.

Todos ficaram calados. E o Verbo, muito nervoso, continuou a falar com sua potente voz:

- Senhores, nós somos um exército composto por soldados talhados na forma de palavras. Lutamos numa guerra eterna para não perder a nossa identidade, para não deixar o invasor nos assimilar e implantar o seu idioma. Apesar da nossa vigilância vem a infame influência e planta uma palavrinha aqui, outra ali e quando abrirmos os olhos já não haverá um idioma, somente um dialeto. É preciso ensinar as crianças, desde cedo, a amar a língua. Como fazer? Ensinando-as a falar e escrever corretamente.

- Vejam os erros de concordância nas redações, isso é só uma parte, sem contar a incompreensão de textos e outras coisas mais. Tudo isso por conta do mau ensino. E vocês ficam aí discutindo bagatelas.

O verbo sentou e chorou. Dona Gramática, pensativa, admitia o erro no ensino da língua.

A festa que começara animada voltou aos “tempos primitivos” e foi preciso um “Imperativo” na tentativa de restaurar a alegria. A orquestra de letrinhas, que parara de tocar, começou a recolher os instrumentos que estavam no chão. E para que não houvesse mais confusão o Sujeito subiu numa cadeira e gritou.

- Aí pessoal, vamos agitar porque essa festa não está mais “manera”, parece um cemitério, pô. Os “manos” vieram aqui dançar e levar um “lero” legal.

- Vejam que falei gírias, também uso a forma culta, isso foi só para mostrar como é belo esse idioma que tem palavras para designar qualquer coisa. Procurem por aí a palavra saudade, ninguém tem, só nós.  Tem mais pessoal, na festa da dona Gramática não há lugar para se discutir problema de ensino, aqui é o lugar da união de todos para formarmos um só corpo. Discutir ensino de gramática, isso é lá com “seu” Ministro.

Todos concordaram e o Sujeito saiu balançando o esqueleto pelo salão à procura de uma Flexão Adjetiva para um giro numa folha de caderno.

(Histórias que contava para o meu neto)

(Maria Hilda de J. Alão)

sexta-feira, 11 de março de 2022

UM GATO NO ESPELHO (história)



 Um gato, parado diante do espelho do quarto de sua dona, discutia com sua imagem refletida.

- Quem é você? Pensa que vai tomar o meu lugar nesta casa? Miauuurur! Aqui não vai ficar. Dormir no meu cestinho nem pensar.
Também não terá os carinhos da menina Lili. Pode sair! Já! Olha, eu já mandei! Sai daí valentão imitador! Miauuurur! Estou ficando nervoso. Olha só o meu pelo todo arrepiado.
O bichano, todo eriçado e com o corpo curvado, partiu para cima da imagem dando uma testada no espelho que doeu bastante. Como o outro bichano não saiu nem se abalou, ele resolveu desafiá-lo para um duelo.

- Não adianta ficar me imitando o tempo todo. Vamos duelar, briga de gato pra valer! Pode ser aqui ou no telhado. O vencedor fica na casa. Miauuurrur!
Uma aranha, que morava atrás da cortina do quarto, cansada de ouvir o falatório do gato, saiu e pendurada num fio de sua teia se pôs a apreciar o teatro que o gato fazia com sua imagem refletida no espelho. Estava engraçado. O gato pulava, arrepiava-se, miava, arreganhava os dentes para a imagem como se estivesse diante de um inimigo.

A princípio a aranha se divertiu. Um tempo depois ela já estava sentindo a agulhada de sua consciência que dizia: não ria da ignorância alheia. O gato não sabia que aquele outro gato era ele mesmo. Foi aí que ela tomou uma atitude correta.

- Olá amigo bichano! Por que está tão bravo assim?

- É que apareceu este gato estranho para tomar o meu lugar. – disse ele sacudindo o rabo com força fazendo uma careta para a imagem.

- Amigo, amigo! Este que você vê aí é você mesmo. O amigo está diante de um espelho. Veja, se eu esticar o meu fio mais um pouco eu vejo outra aranha que sou eu mesma.

- Dona aranha, mas que confusão é esta? – perguntou o bichano.

- Não tem confusão nenhuma. Veja! – e esticando o fio de sua teia, aranha apareceu no espelho gritando para o gato:

- Olha eu aí! Tá vendo? É a minha imagem. Eu não vou brigar com ela pensando que ela quer a minha casa. É isso amigo. É o seu reflexo no espelho.

- Então este sou eu...eu? Meu Deus! Não sabia que eu era assim! – perguntava de boca aberta o bichano.

- Claro! É você mesmo. – respondeu a aranha contente.

- Todos os gatos são iguais a mim? – quis saber.

- Não. Todos os animais são diferentes uns dos outros. Para dar um exemplo: tem gato todo branco, malhado, preto e branco, grande, pequeno e assim por diante. Isso vale para todos os seres existentes na natureza. Se tudo fosse igual, já imaginou o quanto monótono seria o mundo? – respondeu a aranha.

Então o gato, já mais calmo, começou a olhar mais atento para o espelho. Levantou a pata da frente, a imagem repetiu o gesto. Abriu a boca imitando um tigre, a imagem fez o mesmo. Ele gostou do que viu e disse para a aranha.

- Obrigado amiga aranha por ter me esclarecido. Eu nunca havia me visto num espelho, daí a minha ignorância.

- Adeus amigo bichano! Não fique muito tempo diante do espelho. - disse ela rindo e escalando, lentamente, o fio da teia para voltar a sua casa atrás da cortina do quarto.

Faça como a aranha. Não ria, esclareça.

10/10/07.

(Maria Hilda de J. Alão)

(histórias que contava para o meu neto.)

O GATO DESAFIANDO O CÃO (Cordel Infantil)

 

Cansado de dormir o dia inteiro,
Numa fazenda do sertão mineiro,
Resolveu do nada o gato matreiro
Desafiar o cão tido como bagunceiro.

Foram para o meio do terreiro os dois,
Pulando por cima das cacas dos bois,
O gato pensando no que comeria depois
E o cão dizendo: gato bobo, ora pois.

Sentaram-se cada um em uma cadeira,
Com suas violinhas feitas de madeira,
Começando o desafio com uma zoeira
Que mais parecia serra de madeireira.

Para assistir a perigosa brincadeira
Veio o macaco trazendo uma bandeira,
A Coruja prateada que mora na aroeira
E Mimi, a velha gata alcoviteira.

O gato, dedilhando a desafinada viola,
Dizia que cão valente é coisa de gabola
Que ele, gato, é esperto e tudo controla
E quando ele rosna tem cão que rebola.

O cão respondeu: A mim você não enrola.
Por que disparas como tiro de pistola
Ao ouvir minha voz se descontrola
Entrando por aquela portinhola?

E foi pela noite adentro o desafio.
Todos cansados diziam ser desvario.
Quem é mais valente é papo sombrio
Essa cantilena está me dando calafrio,

Disse o macaco: não vejo benefício
Em continuar com esse desafio
Por que guardar esse ódio doentio
Que faz da alma um terreno baldio?

Abraçam-se o cão e o gato matreiro
E foi saindo o macaco todo lampeiro
Dizendo: volto feliz para o coqueiro
Pois acabei com aquele salseiro.

30/11/17

(Maria Hilda de J. Alão)
(histórias que contava para o meu neto)

 

segunda-feira, 7 de março de 2022

DOM RATÃO NA MANSÃO (cordel)



Chegou de mala e cuia Dom Ratão
Aos portões da nobre mansão,
E foi entrando cauteloso, sorrateiro,
Através do imenso terreiro.

Aproveitando a saída do cozinheiro,
Invadiu a cozinha como um guerreiro
Indo se entrincheirar lá no canto
Do armário que era um espanto

De tanta comida parecia um empório.
Ficou bem quietinho o finório
Esperando a noite chegar ao auge,
Pois é no silêncio que um rato age.

Dom Ratão cansado adormeceu.
Sonhou que o armário era só seu
Até convidou Ritinha, a sua ratinha,
Para saborear de tudo que tinha.

Sonhando Dom Ratão murmurava:
Sorte tamanha eu não esperava
Ritinha, minha linda, meu amor,
Sinta deste queijo o sabor.

De repente um som monstruoso
Acabou com o sonho dengoso
De Dom Ratão e da rata Ritinha.
Era Hércules, o gato, que vinha

Expulsar da cozinha o intruso.
Não, não ficarei confuso,
Preciso de um plano para escapar
Aqui não dá para eu morar.

Na primeira distração do gato ele saiu,
E em desabalada carreira se viu
Voltando para a casa pobre no escuro
Em cuja despensa só existe pão duro.

10/01/07

(Maria Hilda de J. Alão)
(Histórias que contava para o meu neto)

sábado, 5 de março de 2022

A ABELHINHA (infantil ecológica)

 

Abelhinha aonde tu vais?
Vou fabricar mel nos laranjais,
Lá nas nuvens espaciais,
Aqui tem gente demais

Devastando os mananciais.
Logo não haverá mais flores
Para exalar seus odores,
Nem pólen, néctar e cores,
Nem água para aliviar os calores,

Só tortura e muitas dores.
Verás a natureza em estertores,
Os bichos serão sofredores
Por causa de humanos traidores.


05/12/05.
(Maria Hilda de J. Alão)

DOM RATÃO NÃO GOSTA DE PÃO (cordel)


Sou um rato de fina classe
E não há ninguém que passe
A perna para me enganar.
Pão não é a minha praia,

Além de duro ele engorda
Quem mandou eu vir morar
Nesta casa de gente pobre.
Agora estou de malas prontas

De mudança para aquela mansão,
Ali em frente à casa do sacristão.
No armário tem queijo parmesão
Salame, toucinho e pastelão.

Não pensem que é no porão
Que vou morar, não senhores.
É num canto da larga cozinha,
Atrás do armário dos vinhos

Porque eu sou dom Ratão
Um rato de fino paladar.
Com tantas iguarias vou engordar,
Mas já pensei como a gordura evitar.

Farei do escorregador das crianças
Montanha pra minhas escaladas,
Da borda da piscina uma pista
Pra minhas noturnas caminhadas.

Vida como esta é tudo que desejo
Não me critiquem, pois mal não vejo,
Em querer comer do bom e do melhor,
Porque pão duro é o que há de pior.

09/01/07

(Maria Hilda de J. Alão)
(Histórias que contava para o meu neto)


quarta-feira, 2 de março de 2022

O RATO CAIPIRA (cordel infantil)

 

Eu vou contar pra vocês
A história de dois ratos
Que é a mais pura verdade:
Um vivia no campo
E outro na cidade.

O rato do campo convidou
O rato grã-fino da cidade
Para conhecer a sua casa
E viver um dia de felicidade
Fartando-se de comida boa.

Lá chegando o convidado
Ficou tão decepcionado
Com o banquete oferecido,
Pelo novo amigo, o rato caipira,
Só grãos e pão amanhecido.

Nada disse o convidado,
Mas resolveu que ia humilhar
Aquele rato caipira
Que não sabia recepcionar
Um rato chique da cidade.

Depois de muito mal comer
O rato chique convidou
O caipira que não rejeitou
Para juntos irem à cidade
Só assim o pobre saberia

O que é uma amizade
E também ser anfitrião
Oferecendo um banquetão
Com tudo que há de bom
Na cozinha de dona Zoraide.

Chegaram tarde os dois.
Na casa do rato chique
Tinha comida de todo jeito
Até queijo de Moçambique
Para comerem depois.

O rato caipira a tudo elogiava:
tudo é tão fairto, tão bão.
Mi adiscurpe amigão
Si li dei nacos de duro pão
Purque num sô chique cuma ocê.

Já se dispunham a comer
Quando um homenzarrão,
Com um pontapé, abriu a porta.
Os dois se puseram a correr
Para escapar da enorme bota.

Quando se fez silêncio,
Voltaram os dois amigos
Para a cozinha de Laurêncio,
Um cozinheiro antigo
Daquela nobre residência.

E o fato se repetiu:
Na mão uma vassoura
Laurêncio entrou grunhindo:
Onde tu estás rato atrevido?
Sei que trouxeste um amigo.

Aparece, pois tenho a vassoura
E com esta grande tesoura
Cortarei os teus bigodes.
Comigo tu não podes
Vou te ensinar a não roer,
Toda vez que eu abastecer
A despensa da cozinha,
Os alimentos caríssimos
Que só gente consome.

Vê se desaparece, some!
O pobre rato caipira tremia
Diante daquela situação.
Então ele disse ao rato chique:

Amigo, qui confusão
Pra ocê cumê um pedaço di pão!
Perfiru cumê grãus i pão duro
Na santa paz du sinhô
Du qui sê cuma ocê chique

Cumendo queijo di Moçambique
I ficar tremilicando
Toda veiz qui esse home
Entra fazeno um baruião.
Desse jeito ocê morri di fome.
Perfiru a simplicidade
A viver nessa fairtura cum medo.

Lá se foi o rato caipirinha
De volta ao seu amado campo
Onde vivia em fartura
Sem que nenhuma criatura
Aplicasse-lhe tanta tortura.

18/09/11
(Maria Hilda de J. Alão)
(histórias que contava para o meu neto)

 

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